O "principal problema hoje é como sobreviver ao próprio crescimento. As leis vigentes não prevêem um Sistema Nacional de Cultura. Não atendem nossos mestres e griôs da tradição oral. Não dialogam com a realidade. "Chico Simões é mamulengueiro, educador comunitário, atua na coordenação do Ponto de Cultura Invenção Brasileira e da Rede Escola Viva, além de organizar festivais e encontros de culturas populares. Desde 1983 viaja pelo mundo convivendo e aprendendo com mestres de várias tradições culturais; mamulengo, bumba-meu-boi, ventríloquo, mágico, palhaço e camelô.
"Existem no Brasil uns duzentos mil pontos de cultura. Agora sobre a in-capacidade do MinC em conhecer e fortalecer esses pontos, acho que o pessoal caiu foi na real. Imagine 20 mil processos numa sala apertada e três funcionários verificando cada detalhe da subjetividade legal que cada parecerista pode ter com relação a cada projeto. "Depois de viajar três anos pelo nordeste brasileiro convivendo com o amigo Carlinhos do Babau, do Carroça de Mamulengos, seu grupo, o Mamulengo Presepada, começou a atuar em Brasília no ano de 1985. Mestre Solon, do Mamulengo Invenção Brasileira, presenteou o grupo com os primeiros bonecos e abençoou o caminho que se segue. E assim começou o que chama hoje de Ponto de Cultura Invenção Brasileira, um espaço de convivência e produção cultura que, entre outras coisas, virou o proponente do projeto TEIA 2008, que será realizado no mês de dezembro em Brasília.
Fotos de Ivaldo cavalcante
Sobre essa experiência Chico Simões concede a seguinte entrevista a Cultura e Mercado:
Leonardo Brant - Como será a TEIA 2008, quais as diferenças e os aprendizados trazidos das outras edições?
Chico Simôes - A TEIA BRASÍLIA 2008 esta sendo construída pelos pontos de cultura, por uma coordenação eleita pelo movimento nacional e por uma comissão executiva que integra representantes de pontos de cultura, com profissionais experientes em diversas áreas de produção de grandes eventos. Essa combinação e o fato de Brasília ter espaço e vocação para receber bem movimentos sociais já marcam algumas diferenças. Ou seja, os pontos de cultura estão organizando a TEIA. Estamos mais maduros, aprendemos muito com as edições passadas e compreendemos que fazemos parte de um processo acumulativo de experiências e dinâmicas chamado “cultura viva”. Vamos cometer novos erros e novos acertos, mas vamos procurar deixar marcado para sempre a passagem da TEIA por Brasília. Posso adiantar que no dia 15 de novembro vamos ocupar a esplanada dos ministérios e a praça dos três poderes com um cortejo cultural nunca visto na cidade. Estamos convidando todo o movimento cultural brasileiro para se fazer presente nessa grande festa, uma “re-proclamação” da “re-pública” brasileira através da cultura.
LB - O Ministério lançou semana retrasada o patrocínio da Petrobras como se a TEIA fosse um evento governamental. Sabemos que a gestão e a responsabilidade civil da TEIA é 100% da organização que a produz. Como se dá a relação entre governo e sociedade civil nesse caso?
CS - O MinC através do Programa Cultura Viva inaugurou uma forma de fazer política onde o estado ao invés de produzir, apoiar e cobrar, dispõe e compartilha a gestão de alguns projetos culturais, como o programa Cultura Viva e os pontos de cultura, mas isso não é fácil porque é novo e nem sempre sabemos como nos comportar na fronteira dessas relações novidadeiras: o que cabe a sociedade civil e o que compete ao estado? O aparato legal não foi feito pra isso e não ajuda. Pelo contrário. Precisa ser revisto urgentemente porque esta engessando muita ação cultural da sociedade civil, então somos obrigados a procurar apoio, através da lei rouanet, nas empresas privadas ou públicas. É uma maneira de acessarmos diretamente recursos que nos chegariam através dos impostos que essas empresas devem. Considerando a burocracia monstruosa sobre a qual o Estado está apoiado, a saída via lei de mecenato é uma saída legal que se bem administrada pode resultar em retorno rápido e eficiente dos recursos públicos para o público a que eles se destinam. A Teia é um evento de interesse público com apoio governamental.
LB - O que é o Fórum Nacional dos Pontos de Cultura. Como foi criado, como está organizado, quais as suas competências e metas a para a próxima TEIA?
CS - O fórum é a instância política do movimento organizado dos pontos de cultura e foi criado na TEIA 2007 para dar expressão ao corpo coletivo do movimento. É formado por um representante de cada um dos 850 pontos presentes em todo país tendo para próxima TEIA a tarefa de discutir a pauta imposta pela nova realidade política cultural como a estadualização dos pontos de cultura, os 60 anos da declaração universal dos direitos humanos, um novo marco legal para a relação do Estado com o movimento cultural - lei Cultura Viva e outras demandas e questões políticas do movimento.
LB - Na sua opinião, quais os principais problemas do programa Cultura Viva hoje?
CS - O principal problema hoje é como sobreviver ao próprio crescimento. As leis vigentes não prevêem um Sistema Nacional de Cultura. Não atendem nossos mestres e griôs da tradição oral. Não dialogam com a realidade. Se não convencermos o Congresso Nacional que precisamos mudar algumas leis para entramos no século XXI, como nação marcada pela sua forte identidade cultural, seremos engolidos pelo processo de globalização do consumo de bens materiais e imateriais importados. Finalmente os próprios pontos precisam reconhecer-se em rede como corpo social saudável que expressa a diversidade e a identidade cultural brasileira, ouro vivo da cultura universal escondido por séculos dentro do pau oco dos santos imperialistas mas que agora se liberta em comunhão numa teia de redes sinérgicas que escapam até mesmo as auto-definições. Viva Glauber Rocha!
LB - Na última TEIA, em novembro de 2007, o governo federal prometeu o patrocínio a 20 mil pontos de cultura até 2010, dentro do programa Mais Cultura. Esse número já caiu para 2 mil nos últimos discursos do novo ministro. Por que esse meta caiu tanto?
CS - Pra mim não caiu a meta, mudou o conceito. Existem no Brasil uns duzentos mil pontos de cultura. Agora sobre a in-capacidade do MinC em conhecer e fortalecer esses pontos, acho que o pessoal caiu foi na real. Imagine 20 mil processos numa sala apertada e três funcionários verificando cada detalhe da subjetividade legal que cada parecerista pode ter com relação a cada projeto. O que pode, o que não pode? O processo de Kafka perde feio, então surgiu a saída da estadualização. Mas estamos apenas transferindo o problema. O que precisamos mesmo para manter a meta de identificar e fortalecer pelo menos 20 mil pontos de cultura é de desburocratização e transparência, temos economia e demanda, falta vontade e força política do governo e mobilização dos movimentos culturais para cobrar. Agora é bom lembrar sempre que com relação ao passado já avançamos muito, estamos no caminho e ainda temos muito que avançar. A luta é contínua!
Fonte::: CULTURA E MERCADO veja o site : http://mail.google.com/mail/#inbox/11bff4c63c60310d
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