

“Chomolungma”
A montanha revelou-se,
devagar como um grande amor

Como bem definiu Robert Macfarlane, em seu Mountains of the mind, “visionary amplitudes of altitute”. E, também, o prazer sem fim de estar bem e em paz em qualquer lugar. É isso o que me faz queimar os músculos das pernas, me deixar com nós nas costas e exercitar ao máximo a economia do ato, tão esquecido, de respirar com concentração e consciência vital
Ontem, voltando a Kathmandu, feliz por estar voltando a “civilização”, dei-me conta pela centésima vez (e nem precisava dar-me mais conta disso) que a vida com a montanha, no meio da natureza, é bem mais vida, bem mais sonho, bem mais intensa, bem mais… real. São momentos, são dias, são situações, que me promovem, me deslocam, me transportam, para um universo sem modernidade, sem tecnologia, sem aceleração. Acho que me vejo como um mergulhador das altezas, ou um montanhista das profundezas. Montanhas, já disse antes, são altares. Então, acordei, calcei as pesadas botas, e fui rezar. Lembrei-me da bela frase de Kim Stanley Robinson, no clássico ‘Escape from Kathmandu’: “One of those quiet Himalayan moments, where the world seems like an immense chapel”. Quando me perguntam (e aqui na Ásia sempre perguntam) qual é a minha religião, qual é o meu deus (ou Deusa), divirto-me respondendo “minha religião é o caminhar na natureza, passear pelo mundo”, e que meu deus (ou Deusa) “é o Sol, a Lua… tudo o que é para todos”.
Quando nos reencontrarmos terei muito mais inspiração e tempo para contar-lhes sobre a textura de cada pedra e de cada rosto que toquei com os olhos ou com os dedos, nesta viagem inesquecível aos pés da maior montanha do mundo.
Beijos e abraços de 8.850 metros
João
PS: O nome tibetano para o Everest é, há muitos séculos, Chomolungma, “Deusa Mãe do Mundo”.
PS 2: Este mixto de relato-mensagem é especialmente dedicado a melhor mãe do mundo, a minha! Dona Joy Santos Barbosa, alpinista de pedras-mais-que-preciosas. Com todo o carinho e amor para ela (e para todos vocês também) segue uma seleção de “imagens das alturas” feitas com a melhor luz disponível aos olhos. Valeu mãe! … mais uma vez, tocamos a troposfera!
A última foto nao é minha. Foi feita pela montanhista chilena Francisca Caballero. Sou eu, depois de escalar nas geleiras do glaciar do Khumbu, ponto de partida para os alpinistas que escalam o Everest, o Lhotse ou o Nuptse.

Tutche! Sala tetu!
Grato. Até breve!, na língua Sherpa.
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